- Como assim, Vô?
Então,cortou o topo da carambola amarelada e me mostrou uma pequena estrela - coisa do vô, pensei e no seu colo, meu pensamento todo carambolava. Ele dizia que era por isso que seus cabelos enrolavam nas pontas dos fios:
- É anzol pra pensamento,Bia. Vovô precisa dele pra não deixar nenhum escapolir. Pensamento dana pra fugir mas os meus ficam presos aqui - e apontava pras pontas dos fios, arrancando deles o pensamento mais comprido. Eu não tinha anzóis e as idéias desciam pelos meus fios-escorrega, se divertindo. Vovô achava que idéia era pra ser livre mas dizia que se escorregasse rápido assim, ela desexiste.
- Desexiste,vô?
- É. - e da estante pegou um livro,esse eu nunca tinha visto na prateleira. Abriu em qualquer página e disse:
- Bia, lê essa história pro vô?
- Mas aqui nada tá escrito!
E ele riu , tentando enrolar as pontas dos meus fios.
- O ar é pintado de que cor?
- Azul- disse convicta.
- Também, Bia. O ar é pintado do que respira e da mesma cor é o vazio.Por isso, neste livro em branco o Tudo está escrito.
Por que será que vovô sempre me conta coisas esquisitas? - pensei.
Vovô abriu o livro novamente em qualquer das páginas do seu vazio e dele, brotaram palavras infinitas. Minha cabeça girava, vovô e eu no meio daquela multidão de palavras, pensei em fugirmos pra outro Nada mas... o que adiantaria? Todo Vazio era tão tumultuadamente preenchido!
-Já sei!- disse e todas as palavras me olharam.
- Era uma vez...- gritei em meio ao tumulto delas.
As palavras,então, foram me seguindo e, assim,o em branco ia desexistindo...
Juliana Gelmini
co-autor: o Vazio